Nem sei o que sou. Nem sei o que fui e, agora, nem o que serei. Ah… e nem sei o que escrever – por patético que isso possa parecer. Como escrever aos que partem? Eu só sei o que vivi. (se sei?) E acho que escrever é suficiente (ou : será?)
Você surgiu na minha vida despretenciosamente e depois, tudo mudou, e você continuou despretenço. Nos primeiros encontros, sem eu nunca te ver, eu me assustei – como a criança retardada e paranóica que acha que há um monstro debaixo da cama, quando quem sabe há pó ou uma cueca fedida.
Mas, de fato – tudo mudou em minha vida. Você era outra coisa. Pensava diferente. Escrevia diferente. Sabia diferente. Ficávamos nós e aquele bando de dementes a conversar na internet … e o que eu trocava com você era mais do que palavra, era a inteligência. Não que quiséssemos constituir juntos uma Novelle Heloïse, isso seria apenas romantismo. E pra ser honesta, eu odeio Rousseau (e quem não odeia?). Mas ,digamos que eu te idealizei. E como não? Amar quem se desconhece seja talvez o amor mais verdadeiro. E o mais ingênuo. E o mais idiota. Platonismo de quem está na varanda e joga garrafas com bilhetes na rua , conseguindo , no máximo, acertar alguém na cabeça, sem que o bilhete encontre seu endereço. Mas machucando, ainda assim. E quem mandou o otário passar bem na hora do meu arremesso de peso? Talvez me sinta culpada por isto…
Bom, não vou me colocar tão assim pra baixo. Só digo: amei o que você me mostrou. Amei a tua pele nunca vista como uma leiga: olhei tua paisagem e não sabia como se chamava o sol ; olhei tua pintura e sou uma estúpida com quadros ; olhei, como utopia, tua figura, querendo-a tato, como um revolucionário quer , do sonho, materialismo.
Agora é tarde. São, creio eu, … Bem, não sei que horas são. E é tarde também porque você se foi. Quero dizer, não completamente. Ainda deve haver um seu cadáver fétido pra contar história. E talvez seja ele quem tenha me convidado para o seu enterro.
Pois, como não pensar que você ainda está vivo?
Nunca te vi, nem sei se as fotos deixadas são seu perfil, sua face, seu corpo . E se não são, de quem você usurpou a vida? No fundo, como um fã, eu acho ainda que Elvis não morreu. E o pior de tudo é que acho que ele está é sacaneando (o que no caso de Élvis, seria uma reboladinha, mas no nosso,vai saber?). Sacaneando, a bem dizer, porque não sei nada sobre você. E acredito no seu personagem, na sua verossimilhança. Tenho todos os dados, sei até que você morreu (e nem sou médico ou pai-nosso-que-estais-no-céu). No entanto, nem isso sequer pode ser verdade. Você poderia estar morto e, ainda, eu iria ao seu enterro, vendo alguém na cova, e você rindo , desdenhando ou sei-lá-eu.
Sei-lá-eus. Isso foi o sempre-obtido. Quando achava que me aproximava, nada achava, só mais informações: um primo novo de nome esquisito, Orictéropo; uma avó que Morava em outra cidade; um endereço que não consta em nenhuma lista telefônica - e olha que eu me esforcei pra estar a par de todas, acabei até por fazer uma leve coleção, bibliotequei-a inclusive e, por causa disso, decorei até alguns números aleatórios, acreditando que pudessem ser o seu. E ,de fato, foram, só que sem o fato e sem o ser. Porque não apenas os números não foram, mas nem o ser mesmo foi e ,agora, números se foram, foi-se o ser. Se é que o era, ou fora, ou puta-que-pariu, o verbo ser e o substantivo me embananam toda, apesar de eu adorar bananada. Entende a piada?
Os mortos, os vivos, os mortos-vivos sabem rir? Bom, se souberem, devo estar hilária. Eu, que nem sei se, salvo exagero, estou morta, viva, morta-viva. Por favor, me vê aí uma categoria que eu já nem sei mais de mim. E já nem mais rio.
Puts...
Rio, lembro de quando estava lá e te mandei aquele e-mail, lembra? Nunca estive tão feliz em minha vida. Um e-mail e toda a minha sede de auto-engano saciada. Pois é isto que sempre quis e que acho que sempre queremos – satisfazer as próprias mentiras. E amar você é a maior felicidade por isto - posso ser o que eu quiser. Posso ser a mulher que eu quiser... Contigo já fui tua, santa, já fui a outra,a de ninguém,a de todos, já fui até uma coisa, ou outra, ou qualquer. Pude ser todos os tipos de mulheres e, no fundo, nenhuma delas me foi totalmente (bom, talvez eu tenha resquícios de algumas – é que algumas mulheres são um pouco grudentas, você sabe).
Enfim, mas tenho que terminar.A carta está meio longa e ando com um pouco de preguiça, sabe como é, a vida continua, contudo, as cartas tem data de validade e podem ser prolixas, ou vão pro lixo. Trocadilho besta que inventei agora para pedir que não mande esta para o lugar mencionado acima, afinal, sei lá, talvez ela valha a pena ser lida, vai? Pelo menos minimamente?
Bom, espero só que, onde quer que você esteja… enfim, você está? Já disse que este verbo é filho da puta e confesso que não sei bem lidar com ele e tal… É melhor terminar esta coisa à toa aqui.
Olha, será que você pode me passar seu endereço? Se não for assim, vou ter que te mandar esta carta por e-mail, daí, não será mais carta , mas tudo bem… aliás, não sei se transcendentalmente ela chegará no onde-quer-que-você esteja. Sei lá, em carteiros em confio, porém, por e-mail pode ser que volte aquele negócio dizendo não-sei-que-lá “failure”, sabe?
Enfim, só queria te dizer que se houver um deus – que você fique com ele. E que se não houver, bem , aí fodeu de vez e vejo o que faço. E desculpe a mistura de tudo, estou um pouco nervosa é a primeira e a última vez que te escrevo algo por carta… daí fico meio pra-lá e pra-cá com a lingua, você entende, né?
Bom.Fim.
Atenciosamente (Apesar de eu estar meio distraída hoje e, por isso, perdoe os erros de digitação ou de português)e beijos,
Aquela menina lá
Ps: (não quero colocar nome, vai que me leem – fico com vergonha!).
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on domingo, 28 de fevereiro de 2010
at 08:53
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Os posts neste blog devem ser lidos de cima pra baixo (é a seqüência dos capítulos na "história").?xml:namespace>
Como o blogspot coloca os posts mais recentes em cima, a gente rearranja a ordem deles alterando o tempo da postagem.
Por isso os textos aparecem como sendo todos de 28 de fevereiro (e isso não é verdade),
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É também o Dia da Ressaca no Brasil.
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